29/10/2013

Os dez anos da Escola

Neste ano de 2013 festejamos a décima edição do Curso da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho, da Diocese de Caxias do Sul. Ele teve sua gênese em 2004, durante os preparativos para a Romaria do Trabalhador, que a Diocese receberia em 2005, e contou, desde o início, com o apoio e parceria do Instituto Humanitas, da Unisinos (IHU).
Ao longo desses anos, a Escola buscou trazer à pauta alguns dos temas mais relevantes que perpassam a nossa sociedade: ecologia, ética, história, partidos políticos, mundo do trabalho, Bíblia, fé, entre outros. Trouxe para o debate, inclusive, assuntos que alguns diziam já não se fazerem necessários, como capitalismo, socialismo, regimes totalitários, a nossa jovem e lenta democracia.
Nesta nossa era - moderna, pós-moderna, pós-humana ou de outra definição qualquer -, não podemos deixar de reconhecer os inúmeros avanços conquistados para o bem do ser humano: a velocidade das informações, o aumento da produtividade, as conquistas na área da medicina... Também é inegável que vivemos numa sociedade de contrastes. São rotineiros os anúncios sobre recordes na agricultura e aumentos fantásticos na produção de grãos, mas quem liga para o fato de que, mesmo com esses recordes, temos uma parcela considerável da população passando fome? Quem se importa se esta produção é a partir de sementes modificadas geneticamente e com uso indiscriminado de agrotóxicos? Quem se importa com a poluição da água, da terra, do mar e das mentes?
Somos capazes de dar a volta ao mundo em aviões velozes, cruzamos fronteiras com nossos veículos potentes pregando direitos e acesso de todos a tudo, mas, quando somos convidados a colocar isso em prática, não aceitamos a vinda de outras pessoas para as nossos territórios, nem nos chama a atenção se o “sonho” de um mundo melhor “naufraga” em mares para passeio.
No nosso mundo do trabalho, não temos mais colegas, mas concorrentes, “inimigos” capazes de tirar a “minha” oportunidade de conseguir a “minha” casa, a “minha” televisão, o “meu” carro – conquistas para as quais fazemos horas extras, esquecemos o lazer, a família. Isso acontece porque os laços comunitários enfraqueceram, a solidariedade ficou no passado e os valores que permitem uma vida digna são corrompidos pela humilhação e sem acesso aos meios de “teleação” (Bauman).
Pensar incomoda, e por isso corremos o risco de deixar que outros pensem por nós, nos desinformem, desvirtuem as notícias, omitam fatos, mintam descaradamente, ou mesmo que as máquinas pensem por nós. Nem fazemos questão de manter viva a nossa história e o período desumano em que vivemos. Desconhecemos ou ignoramos os saberes diferentes de cada um (Paulo Freire) e não nos ocupamos em buscar as respostas que nos possibilitem criar a consciência que nos torna livres. Estas e outras questões a Escola traz à mesa para o debate.
Profundamente comprometida com o Ensino Social da Igreja, a Escola busca contribuir para a formação e articulação de lideranças, para a gestação de uma mentalidade nova, capaz de participar na construção de uma sociedade solidária, colaborando para que os indivíduos - fechados em si mesmos, vivendo numa sociedade desigual e fragmentada - se descubram capazes de romper o casulo da indiferença e se tornem atores nessa realidade. Isso tudo, através da reflexão interdisciplinar dos três eixos que dão nome ao curso:
- , capaz de fortalecer os cristãos para sua responsabilidade na construção de um mundo melhor, exercendo o seu protagonismo;
- POLÍTICA, com a qual possamos passar de uma democracia representativa para uma democracia participativa a partir do nosso meio local;
- TRABALHO, contexto do qual é necessário entender as mudanças e crises, e como estas são determinantes no todo da nossa vida.
Se vem de Deus...” (At 5,39) era frase usual da irmã Brenda, quando, nas reuniões de avaliação e programação da Escola, nos deparávamos com situações conflitivas, negativas ou desafiantes, mas sobre as quais tínhamos de decidir e decidíamos com certo receio.
Depois de dez anos, quando perto de mil pessoas passaram pela Escola, podemos dizer que ela foi fruto da inspiração divina - e aqui me refiro à irmã Maria Brendali Costa e ao padre Gilnei Fronza, que, grávidos desta ideia, imprimiram à Escola uma marca que a permitiu chegar a essa década de existência. A eles, nosso agradecimento especial. Agradecemos também a muitas e tantas pessoas que, de forma abnegada, dedicaram e dedicam tempo e carinho em favor da Escola, bem como a Dom Paulo, que apoiou a iniciativa; ao IHU, sempre parceiro e ao Centro de Pastoral, sempre acolhedor. Agradecemos a todas e todos, alunas e alunos, que de 2004 até hoje acreditaram nesta Escola e na sua proposta, participando e convidando pessoas para fazerem o curso. Se vamos tê-la por mais um, dois, cinco, dez anos - não sabemos. Mas, “se vem de Deus...”
José Antonio Somensi (Zeca), pela Equipe de Coordenação da Escola
(aluno em 2005, integrante da equipe desde 2006)
Caxias do Sul, 26 de outubro de 2013

Seminário comemora 10 anos da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho


Neste sábado (26/10), acontece um seminário no Centro de Formação Pastoral que reúne ex-alunos com a atual turma da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho. Também se fazem presentes pessoas que ajudaram a concretizar e consolidar o projeto que comemora 10 anos de existência neste evento. Ao longo destes anos mais 850 pessoas participaram da Escola que tem como objetivo formar e preparar lideranças da comunidade.

O atual coordenador da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho, Padre Gilmar Marchesini salienta a importância do trabalho em equipe para o sucesso na atividade, a estrutura disponível no Centro de Formação Pastoral e os depoimentos dos ex-alunos sobre o quanto foram significativas suas participações.

O seminário segue durante a tarde de hoje com um a vasta programação entre, palestras, debates e apresentações musicais.

A Escola de Formação Fé, Política e Trabalho é uma promoção da Diocese de Caxias do Sul em parceria com a UNISINOS – Instituto Humanitas.

por Cleberson Portela , dia 26/10/2013 às 11:42

http://www.redesul.am.br/Noticias/Geral/26/10/2013/Seminario-comemora-10-anos-da-Escola-de-Formacao-Fe-Politica-e-Trabalho/135235/


Escola Fé, Política e Trabalho


Em comemoração aos 10 anos, a Escola Fé, Política e Trabalho da Diocese de Caxias do Sul realiza hoje um seminário com o tema Memória e Perspectivas. A programação começa às 8h30min, no Centro de Formação Pastoral, e inclui reencontro de ex-alunos, espaço para debate, partilha e show do cantor Demétrio Xavier.

Nesses 10 anos, mais de mil alunos já passaram pela escola, conta o coordenador, padre Gilmar Paulo Marchesini:

– A perspectiva de formação é cidadania, solidariedade, cuidado, empoderamento das pessoas. O foco é a doutrina social da igreja, a mudança de época, os novos desafios da fé, do trabalho, das políticas públicas, da economia solidária, da ação transformadora que está em todas as pessoas.

PIONEIRO - 26/10/2013 | N° 11826 - Mirante | Márcio Serafini
http://www.clicrbs.com.br/pioneiro/rs/impressa/11,4313680,159,23029,impressa.html





Homenagem à Escola de Formação, Fé, Política e Trabalho, na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul, em 17/10/2013:

"Excelentíssimo senhor presidente, vereador Edson da Rosa; senhores vereadores; [cumprimentar autoridades da mesa]; coordenadores atuais da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho, Padre Gilmar, Irmã Antonia e Padre Adilson que também cordena atualmante, o Centro Diocesano de Pastoral, autoridades já citadas; senhoras e senhores.

Quero agradecer aos nobres pares desta Casa por aprovarem esta homenagem e pela oportunidade que me é dada de ser a sua porta-voz neste momento especial. Pra mim uma alegria muito grande, homenagear a Escola de Formação Fé, Política e Trabalho.

Falar da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho é falar da histórias de muitas pessoas, que aceitaram o desafio de se questionar sobre o que sabiam e resignificar conteúdos, fatos históricos e porque não dizer, resignificar a própria Igreja. Uma das intenções da escola sempre foi a de formar um novo quadro de lideranças cristãs, gestando assim a criação de uma mentalidade nova, mais participativa e de acordo com o Ensino Social da Igreja.

Bom, mas antes de começar a falar da Escola, é necessário contextualizar aquele momento. Em 2000, padre Gilnei Fronza assume a coordenação da Pastoral da Diocese de Caxias do Sul. Nesse período, em conjunto com a Irmã Brenda cria-se um espaço para as pastorais sociais, o Centro de Pastoral e a coordenação de pastoral.

Em 2001, ocorre um movimento com ideias renovadoras de retomada da Cáritas. Na época, havia um esfriamento das pastorais e questões sociais e a política perdia sua credibilidade, muitos militantes abandonavam a luta e os espaços políticos. De forma gradual novos trajetos foram sendo trilhados.

O medo de que a relação fé e vida caíssem no esquecimento, correndo o risco de serem arquivadas em nossas mentes, fez com que uma tarefa difícil e audaciosa fosse iniciada. Estava começando uma nova fase árdua, complexa e de polêmica missão, e que em pouco tempo transformaria vidas e renovaria a esperança de muitos fiéis.

Em 2003, após uma ampla discussão no Conselho de Presbíteros e nas regiões pastorais, foi decidido pela criação da Escola de formação fé, política e trabalho. O bispo Dom Paulo Moretto acompanhou os trabalhos. A Diocese havia sido indicada para organizar a Romaria dos Trabalhadores. Foi feito experiência formativa em que se refletisse mais as questões sociais e a doutrina social da Igreja.

A Unisinos através do Instituto Humanitas, passa a auxiliar na fomentação de uma proposta mais comprometedora. O Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores, de Curitiba-PR, foi contatado para ajudar na criação da proposta metodológica e de conteúdos. Foi constituído uma equipe de reflexão e de trabalho que aos poucos agregou outras pessoas.

A escola sempre foi mantida em meio a muitas dificuldades financeiras. A solução foi o rateio das despesas entre o participante, a organização de que faz parte e a Diocese.

Em 2004, inicia a Escola de Formação Fé, Política e Trabalho, sob a coordenação do Pe. Gilnei Fronza e da Irmã Brenda, que representava a Cáritas. A Escola surge com a intenção de juntar elementos e colaborar na reflexão e ação de uma pastoral mais engajada e profética. O desafio era ter uma assessoria competente e não estigmatizada ideologicamente e nem proselitista religiosamente, tentando imprimir dogmas na mente das pessoas. A intenção era de manter um público de no mínimo setenta pessoas, já que havia 70 paróquias na Diocese e se estudava a ideia da representação de todas.

A Escola congregou participantes de vários municípios do Estado para responder ao desafio de construir uma sociedade solidária desenvolvendo a reflexão ética acerca das novas questões políticas e sociais. Nos dois primeiros anos da escola, o grupo se envolveu também na organização da 10ª. Romaria Estadual do Trabalhador e da Trabalhadora, ocorrido no dia 1º. de maio de 2005, envolvendo um grande número de pessoas. Foram realizados muitos encontros, com a elaboração de subsídios, e desta forma a reflexão foi avançando.

A Escola sempre primou por uma metodologia clara que faça uma reflexão a partir da ação e que desta reflexão nasça uma nova ação, um conteúdo sequencial que ajudasse na compreensão da complexidade que se vive atualmente, uma pedagogia de condução do processo em equipe e uma espiritualidade cristã que alimentasse a mística e utopia de um mundo viável e possível. Aprendemos a conviver e a respeitar, na prática, as diferenças, sejam elas religiosas, partidárias ou étnicas, pois, a Escola sempre esteve de portas abertas para qualquer pessoa.

Fé, política e trabalho, eixos ao mesmo tempo autônomos e interligados.

Fé e vida: O cristão precisa se capacitar para atuar nesta realidade conflitiva, contraditória à luz do evangelho e do ensino social, visando a transformação social. Os cristãos têm a responsabilidade histórica na construção de uma sociedade justa, fraterna e sustentável.

Trabalho: A crise do “mundo do trabalho” confunde-se com a crise do modelo de sociedade salarial marcado pelo crescimento econômico e a conquista de direitos sociais através de políticas estatais. Faz-se necessário aprofundar as mudanças na organização do trabalho e na sua própria concepção, entendido enquanto assalariamento, assim como a flexibilização, precarização, e o desemprego estrutural. Cabe uma reflexão ética acerca das novas questões políticas e sociais, muito diferentes da “questão operária” do final do século XIX e bem mais complexas que ela.

Política: Continua sendo motivo de esperança. É preciso vencer o falso moralismo do ideal, do imaculado, já que a decisão humana é grávida de erros possíveis e de desvios de rotas. A democracia precisa passar do estágio de representatividade para o protagonismo cidadão. Quem opta assume certas prioridades, não todas. A consciência política coletiva nos remete para uma opção ética e evangélica, pessoal e social, pela vida de todos e todas em harmonia com a natureza. Conforme (CNBB, Doc. 82) “Estar obcecado pelo joio, impede o trigo de crescer .”

A fé nos presenteia com novos horizontes; a política e o trabalho nos ajudam a concretizar este anseio.

Nesses 10 anos, passaram pela Escola mais de 850 pessoas e surgiram muitas iniciativas: a criação da Associação de Microcrédito Popular Solidário (ACREDISOL), para empreendimentos individuais; o envolvimento com algumas Associações de Recicladores de Lixo; a realização da Feira Regional de Economia Solidária, almoço e jantar ecológico e tantos outros provocando um debate sobre as questões da ecologia, elaboração de projetos de geração de renda, reciclagens, participação política e o trabalho organizado solidariamente.

E para finalizar permitam-me citar parte do texto do assessor da Escola José Antonio Somensi (Zeca)

“Nesta nossa sociedade, moderna, pós-moderna, pós-humana, ou outra definição qualquer, não podemos deixar de reconhecer os inúmeros avanços para o bem do ser humano. A velocidade das informações, o aumento da produtividade, as conquistas na área da medicina, mas também é inegável que vivemos numa sociedade de contrastes.

É rotineiro ver os anúncios de recordes na agricultura e aumentos fantásticos na produção de grãos e quem liga para o fato de mesmo com estes recordes temos uma parcela considerável da população passando fome? Quem se importa se esta produção é a partir de sementes modificadas geneticamente e com uso indiscriminado de agrotóxicos? Quem se importa com a poluição da água, terra, mar e mente?

Somos capazes de dar volta ao mundo em aviões velozes, cruzamos fronteiras com nossos veículos potentes pregando direitos e acesso de todos a tudo, mas quando somos convidados a por isso em prática não aceitamos a vinda de outras pessoas para as nossas terras, países, e nem nos chama a atenção se o ‘sonho’ de um mundo melhor ‘naufraga’ em mares para passeio.”

Desejo que esta comemoração de 10 anos da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho seja além de uma motivação, um convite a reflexão, mas mais do que isso, um convite a ação.

Parabéns a todos/as que trabalharam na construção da Escola, professores, coordenadores, assistentes e aos alunos."

Vereadora Denise Pessôa

http://www.denisepessoa.com/2013/10/homenagem-escola-de-formacao-fe_17.html

28/10/2013

Escola de Formação Política, no décimo aniversário, é homenageada em Caxias do Sul

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Escola de Formação Política, no décimo aniversário, é homenageada em Caxias do Sul

Hoje, às 15h45min, na Câmara Municipal de Caxias de Sul, RS, será celebrado o 10º aniversário da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho.

A Escola foi criada e implementada pela Diocese de Caxias de Sul. D. Paulo Moretto, então bispo diocesano, e Gilnei Fronza, padre, então coordenador de Pastoral da Diocese, em preparação da Romaria dos Trabalhaodores, promovida pela CNBB Regional Sul 3, procurou o Instituto Humanitas Unisinos -IHU. E desde a sua criação a Escola contou com a parceria do IHU.

A organização, o conteúdo e a metodologia da Escola se inspiraram na experiência, iniciada em 1996, da Escola de Formação Política promovida pelo Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores - CEPAT, de Curitiba.

Desde o início Cesar Sanson, hoje professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e André Langer, ambos doutores em sociologia, e até, recentemente, pesquisadores do CEPAT assessoraram a Escola.

A Escola funcionou ininterruptamente nestes dez anos.

A Escola, com a duração de um ano, sempre em dez etapas, nos finais de semana, ou seja, nos sábados e domingos.

Ela sempre contou com mais de 60 participantes efetivos, isto é, que participaram integralmente da Escola.

No próximo dia 26 de outubro, um encontro com todos e todas que participaram da Escola será realizado em Caxias do Sul.

O Instituto Humanitas Unisinos - IHU se associa à solene celebração e homenagem a ser realizada hoje na Câmara Municipal de Caxias de Sul e se congratula com a Diocese de Caxias de Sul pela coragem e ousadia pastoral de possibilitar a formação política dos/as leigos/as da região serrana. Cumprimenta, igualmente, a coordenação da Escola, que com denodo e, acima de tudo, profissionalismo e competência, soube acompanhar a caminhada da Escola.


http://www.ihu.unisinos.br/noticias/524754-escola-de-formacao-politica-no-decimo-aniversario-e-homenageada-em-caxias-do-sul

26/10/2013

Sábado: Música no Encontro da Escola




Seminário:
Dez anos da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho: memória e perspectivas

26 de outubro de 2013
8h às 18h
Centro de Formação Pastoral - Rua Emílio Ataliba Finger, 685 - B.Colina Sorriso
Caxias do Sul - RS   Fone (54) 3211-5032

Inscrições:
R$ 10 (incluído almoço), via fepoliticaetrabalho@gmail.com

Informações: 
@fepoliticaetrab

Programação:
:: Abertura e mística inicial
:: História e organização da Escola
:: A relação interdisciplinar entre fé, política e trabalho, na pós-modernidade
   Prof. Dr. Inácio Neutzling - Diretor do IHU (Instituto Humanitas) - Unisinos/RS
   Assessor do CEPAT (Centro de Pesquisa e Apoio ao Trabalhador) – (Curitiba/PR)
   Membro do INP/CNBB (Instituto Nacional de Pastoral)
:: Trabalhos em grupos - perspectivas de engajamento para os cristãos e desafios para a Escola
:: Agradecimentos e mobilização para a 11° edição da Escola
:: Sessão "Cantos do Sul da Terra", com Demétrio Xavier. 16h - Aberta ao público - Entrada franca
   Demétrio é violonista e cantor, pesquisador da música crioula uruguaia e argentina,
   vencedor da Califórnia da Canção Nativa de 2009, formado em Ciências Sociais pela UFRGS,
   produtor e apresentador "Cantos do Sul da Terra".



Cantos do Sul da Terra é um programa dedicado à música e à literatura do sul do continente, da FM Cultura 107.7, rádio pública do RS.
"Cantando a aldeia com as vozes da cultura crioula e os sotaques do continente de São Pedro e do continente latino-americano. (...) As diversidades da cultura indígena, negra, colona e imigrante, em suas expressões musicais, na literatura e na cultura popular."
O programa vai ao ar de segunda à sexta, às 13h, com reprise às 6h, mas as gravações estão sempre disponíveis em www.mixcloud.com/track/fm-cultura/cantos-do-sul-da-terra/?order=latest

20/10/2013

Fundamentos da dignidade humana e projeto de uma sociedade sem exclusão a partir da prática de Jesus Cristo

Texto: José Antônio Somensi
Fotos: Fernanda Seibel

 
Como fortalecer a dignidade humana e o respeito aos critérios éticos de prioridade a vida diante dos avanços da ciência? Como termos uma sociedade sem exclusão a partir de Jesus Cristo?

Com estas provocações e ainda tendo presente a homenagem concedida pela Câmara de Vereadores de Caxias do Sul no dia 17 de Outubro, pela passagem de 10 anos de nossa Escola, realizamos nos dias 19 e 20 de Outubro no Centro de Pastoral da Diocese de Caxias do Sul a oitava etapa da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho 2013 – décimo ano.

No sábado (19) o tema foi: Bioética. Fundamentos da dignidade humana, e contou com a décima participação do professor Dr. José Roque Junges – Unisinos.

O padre Dr. José Roque iniciou sua apresentação trazendo para nós o tripé da modernidade:
a) Indivíduo que busca a autonomia, mas enfraquecido dos laços comunitários, alimentados em buscado dos seus desejos individuais, com uma certa independência econômica, dominados por um poder não conhecido, portanto não livres, tratado como” uma coisa” e desta forma afastado de sua dignidade;
b) Ciência e Técnica (racionalidade instrumental) onde a natureza não pode nos ensinar através de seus ciclos, mas é visto apenas como meio ou recurso para o ser humano e onde o conhecimento é colocado em compartimentos e aprendemos disciplinas fechadas e não mais o todo. A natureza vista apenas como consumo/recurso;
c) Estado e Mercado que substituem o papel da comunidade e o sistema social da dádiva (Mauss) e com isso as relações primárias, próximas são substituídas pelo Estado e pelo mercado que determina o que produzir e consumir, além de apresentar e fortalecer uma democracia meramente representativa.

Diante disso concluímos que nesta crise civilizacional temos um indivíduo fechado em si mesmo vivendo numa sociedade de risco, com conhecimentos fragmentados, num estado burocratizado com uma democracia formal, representativa onde se cria um ambiente favorável para estabelecer o poder sobre a vida das pessoas, seja de forma individual ou coletiva.

Segundo o professor José Roque é necessário encarar esta crise através da busca das soluções ambientais e de saúde com uma nova postura que busca colocar a economia como responsável pela vida do planeta através do consumo consciente onde quem tem precisa frear o seu consumo para que os que não têm possam consumir e não mais arcar com as responsabilidades das consequências ambientais, pois se percebe que para manter as áreas nobres limpas transferem-se os lixões para a periferia responsabilizando-os pelo acumulo de lixo. Torna-se necessário inverter a lógica médica tratando as causas a partir de alimentação saudável e saneamento básico (água tratada, esgoto...) dando informação e criando condições para que as pessoas possam conhecer os problemas e enfrentá-los. Fortalecer, no Brasil, o SUS capaz de criar mecanismos que possam cuidar de forma plena as pessoas onde as nossas Ubs atendam de forma eficaz deixando os hospitais para as situações complexas e que os governos entendam que a saúde não se mede pelos hospitais que se tem, mas como cuidamos da água, esgoto, lazer da população.

 

No domingo (20) dando continuidade ao tema da etapa anterior, Bíblia: projeto de uma sociedade sem exclusão, o padre Dr. Pedro Kramer - Fapas – Faculdade Palotina de Santa Maria, traz a questão vista a partir do Deuteronômio onde tínhamos uma sociedade igualitária, justa, tendo Deus a orientá-los, atualiza e sintetiza a partir de Jesus que anuncia o Reino de Deus para cegos, coxos, pobres, surdos, mortos, leprosos.



E aqueles que não ficarem escandalizados por causa Dele com sua prática e na igreja primitiva onde vimos nos Atos dos Apóstolos através da comunhão fraterna, perseverança dos ensinamentos, fração do pão, nas orações colocando tudo em comum, num só coração e numa só alma.


 


Ainda, no próximo sábado, dia 26 de outubro, das 8h às 18h, será realizado o Seminário Dez anos da Escola de Formação Fé, Política e Trabalho: memória e perspectivas. Informações e inscrições: fepoliticaetrabalho@gmail.com.







A próxima etapa acontece nos dias 09 e 10 de Novembro com os seguintes temas: Os fundamentos éticos de uma consciência planetária a partir da Carta da Terra, com a assessoria da professora Ms. Ana Maria Formoso – Unisinos, e As questões de gênero e a inclusão das ‘minorias’ no horizonte de um novo paradigma da civilização atual, com a professora Dra. Cleusa Maria Andreatta – Unisinos.

PROJETO DE UMA SOCIEDADE SEM EMPOBRECIDOS E EXCLUÍDOS NO ENSINAMENTO, NAS AÇÕES E NA VIDA DE JESUS

PROJETO DE UMA SOCIEDADE SEM EMPOBRECIDOS E EXCLUÍDOS
NO ENSINAMENTO, NAS AÇÕES E NA VIDA DE JESUS

Introdução

Não é nenhuma novidade para nós, quando afirmamos que o ensinamento, as ações e toda a vida de Jesus pode ser resumida na expressão REINO DE DEUS OU DOS CÉUS. Também não nos surpreendemos quando se diz que foi Jesus que criou esta expressão e a preencheu com um conteúdo novo, inédito e inaudito. Esta expressão quase não aparece no AT e na literatura judaica e nem mesmo nos outros escritos do NT. Esta estatística pode talvez nos ajudar a perceber a importância da expressão “Reino de Deus ou dos céus” na boca de Jesus: Mc: 13x; Mt: 27x; Lc: 12x; (Sinóticos: 52x); Jo: 2x; cartas de Paulo: 10x; At: 7x.
Além disso, a expressão “Reino de Deus ou dos céus” está relacionada com os mais variados gêneros literários: comparações, exortações, assunto de conversa nos banquetes, condições de entrada e de pertença ao Reino de Deus, a proximidade do Reino de Deus, o envio para testemunhar o Reino de Deus, a dimensão presente e futura do Reino de Deus.

1 Jesus concretiza o Reino de Deus

O que entendeu Jesus com a expressão Reino de Deus? Este Reino, no qual Deus reina, e cujo senhorio abarca tudo, é, para ele, uma realidade futura, mas já agora presente na história. Isto é sintetizado na expressão: “Já agora – ainda não”. Vejamos agora alguns textos nos quais as duas dimensões são destacadas:
- Dimensão futura: Mt 6,10; Lc 11,2; Mc 9, 43-48; 14,25.
- Dimensão presente: Lc 17,20s; 7,22s (Mt 11,5s; cf. Is 35,5ss: cegos, surdos, coxos; Is 29,18s: surdos, cegos, pobres; Is 61,1s: anunciar a Boa Notícia aos pobres).
Em Lc 7,22s encontramos a novidade, o inédito e o inaudito da compreensão de Jesus do R. de Deus. Ele está próximo, ele está acontecendo em 6 grupos de pessoas: cegos, coxos, leprosos, surdos, mortos e pobres. E talvez pode-se acrescentar um 7º grupo: Feliz aquele que não ficar escandalizado por causa de mim!
Sobre isto Jon Sobrino comenta: “No Evangelho, o Reino é utopia, porém uma utopia específica que deve ser bem aquilatada. Responde não a qualquer carência e limitação dos humanos, mas também ao sofrimento dos pobres. E a ela se corresponde com esperança, alimentada pelos sinais do Reino: curas, expulsões de forças destruidoras, acolhida dos desprezados, refeições fraternas”1.
O Reino de Deus, no entanto, acontece dentro de uma situação de anti-Reino. Sobre isto escreve Jon Sobrino: “A relação entre Reino e anti-Reino não é só dialética, mas também duélica, um age contra o outro, o que é preciso entender bem, pois são distintas as forças e o modo de operar de um e de outro. Que o anti-Reino age contra o Reino – o mundo dos ricos e opressores contra o mundo dos pobres e oprimidos – é evidente. Mas que o Reino, por sua natureza, age contra o anti-Reino – o mundo dos pobres contra o mundo dos ricos – é preciso explicar, sobretudo quando surgem movimentos de libertação. Há formas legítimas de luta dos pobres contra o anti-Reino, como podem ser as das organizações sociais e populares, embora seja preciso ter presente a necessidade dos modos adequados de luta e os perigos de desumanização que toda a luta acarreta”2.

2 A fonte onde Jesus bebeu

A fonte onde Jesus bebeu a respeito do Reino de Deus é o Antigo Testamento. Na sinagoga ele deve ter aprendido e rezado esta parte do Sl 96,10.13: Dizei entre as nações: “Iahweh é Rei! Ele governa os povos com retidão. Ele julgará o mundo com justiça e as nações com sua verdade”.
Outra fonte, muito conhecida por Jesus e que o animou, era o Deuteronômio com sua proposta de uma sociedade sem empobrecidos e excluídos: É verdade que em teu meio não haverá nenhum pobre, porque Iahweh vai abençoar-te na terra (Dt 15,4). Aliás, a lei ordena, em Dt 15,1-6, que a cada sete anos deverá acontecer o perdão das dívidas. A lei seguinte, em Dt 15,7-11, prescreve que sempre se deve emprestar ao israelita pobre, mesmo que o sétimo ano de sua libertação da escravidão da dívida estiver se aproximando. E, por fim, a lei, em Dt 15,12-18, detalha que a libertação da escravidão da dívida deve beneficiar não só o irmão hebreu, mas também a hebréia (v.12); que eles não podem ser despedidos de mãos vazias, mas com todas as condições para poder recomeçar a vida em liberdade; e que os servos e servas, que querem ficar com o patrão, deverão receber um furo na orelha (vv.16s)3.
Outra fonte de inspiração eram as várias utopias espalhadas no AT. Gn 1-3, especialmente Gn 2,4b-25, descreve a criação do mundo como um jardim florido onde a pessoa vivia em harmonia perfeita com Deus, com os seres humanos, com os animais e com a natureza. Esta utopia está bem detalhada e concretizada em Is 11,1-9. Este texto descreve um líder que vive a justiça e governa com retidão. Assim os opostos se tornarão irmãos.
Além disso, o profeta Isaías anuncia que as espadas serão quebradas e transformadas em foices e as lanças em podadeiras porque os povos subirão ao monte Sião em Jerusalém e aí serão instruídos por Iavé nos caminhos da justiça (Is 2,1-5; Mq 4,1-3). Há ainda outras utopias em Is 9,1-6; Sf 3,9-26; Jr 34,8-22; Ez 37,1-14.

3 A missão de Jesus é a d@s discípul@s
A missão d@s discípul@s missionári@s é a mesma de Jesus. Por isso, quando Jesus envia seus discípulos em missão, ele recomenda: Dirigi-vos antes às ovelhas perdidas de Israel. Dirigindo-vos a elas, proclamai que o Reino dos céus está próximo. Curai os doentes, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demônios. De graça recebestes, de graça dai (Mt 10,7s).
A respeito do seguimento de Jesus, Jon Sobrino comenta: “Sempre que o cristianismo esteve em crise, os mais lúcidos se voltaram a Jesus de Nazaré e, especificamente, ao seu seguimento. Definitivamente, é Jesus que salva o cristianismo, e é o seguimento de Jesus que nos faz cristãos. O Espírito é a força de Deus para que, de fato, sejamos ‘seguidores’, ‘filhos no Filho’. [...] Imediatamente depois do programático anúncio do Reino, Jesus chama seus seguidores (depois também mulheres com seus nomes). Chama-os para estar com ele, para ser enviados por ele e, à medida que se aproxima do fim, para participar de seu destino. Tudo isso ressoa no lapidar ‘segue-me’, a primeira e última palavra de Jesus a Pedro. O seguimento de Jesus é o modo especificamente cristão de corresponder à passagem de Deus por este mundo, de chegar a seu Reinado”4.
O seguimento de Jesus pode levar ao martírio. Jon Sobrino escreve: “No Evangelho o custoso do seguimento provém da práxis de anunciar a Boa-Notícia de Deus, de construir o Reino e de defrontar-se com o anti-Reino. Segundo Marcos, já no início Jesus entra em graves conflitos por atuar em favor do reino (Mc 3,6). [...] Todos os que se pareceram com Jesus e o seguiram, os que trabalharam pela justiça, pela verdade e dignidade dos oprimidos, foram perseguidos e até assassinados” 5.
Lc 4,14-24; 4,31-44: Estes textos nos dão uma boa idéia a respeito do significado e da importância que a expressão Reino de Deus tem no ensinamento, nas ações e na vida de Jesus.
Em Lc 4,14-24 encontramos o programa de Jesus, apresentado num sábado, na sinagoga de Nazaré: Jesus voltou então para a Galiléia, com a força do Espírito Santo, e sua fama espalhou-se por toda a região circunvizinha. Ensinava em suas sinagogas e era glorificado por todos.
Ele foi a Nazaré onde fora criado, e, segundo seu costume, entrou em dia de sábado na sinagoga e levantou-se para fazer a leitura. Foi-lhe entregue o livro do profeta Isaías; desenrolou-o, encontrando o lugar onde está escrito:
O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou pela unção para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor.
Enrolou o livro, entregou-o ao servente e sentou-se. Todos na sinagoga olhavam-no, atentos. Então começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu aos vossos ouvidos essa passagem da Escritura. Todos testemunhavam a seu respeito, e admiravam-se das palavras cheias de graça que saíam de sua boca.
E diziam: Não é este o filho de José? Ele, porém, disse: Certamente me citareis o provérbio: Médico, cura-te a ti mesmo. Tudo o que ouvimos dizer que fizeste em Cafarnaum, faze-o também aqui em tua pátria. Mas em seguida acrescentou: Em verdade vos digo que nenhum profeta é bem recebido em sua pátria.
A reação à proclamação do programa de Jesus é variada. Há pessoas que o aplaudem, outros que reagem com suspeitas e dúvidas. Mas, há ainda outros que reagem com rejeição.
O texto, Lc 4,31-44, descreve um dia de atuação de Jesus, colocando seu programa em prática, curando todo o tipo de males e doenças. É o Reino de Deus que está se manifestando através da prática libertadora de Jesus. Jesus está inaugurando a sociedade sem empobrecidos e excluídos: Desceu então a Cafarnaum, cidade da Galiléia, e ensinava-os aos sábados. Eles ficavam pasmados com seu ensinamento, porque falava com autoridade.
Encontrava-se na sinagoga um homem possesso de um espírito de demônio impuro, que se pôs a gritar fortemente: Ah! Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste para arruinar-nos? Sei quem tu és: o Santo de Deus. Mas Jesus o conjurou severamente: Cala-te, e sai dele! E o demônio, lançando-o no meio de todos, saiu sem lhe fazer mal algum. O espanto apossou-se de todos, e falavam entre si: Que significa isso? Ele dá ordens com autoridade e poder aos espíritos impuros, e eles saem! E sua fama se propagava por todo lugar da redondeza.
Saindo da sinagoga, entrou na casa de Simão. A sogra de Simão estava com febre alta, e pediram-lhe por ela. Ele se inclinou para ela, conjurou severamente a febre, e esta a deixou; imediatamente ela se levantou e se pôs a servi-los.
Ao pôr-do-sol, todos os que tinham doentes atingidos de males diversos traziam-nos, e ele, impondo as mãos sobre cada um, curava-os. De grande número também saíam demônios gritando: Tu é o Filho de Deus! Em tom ameaçador, porém, ele os proibia de falar, pois sabiam que ele era o Cristo.
Ao raiar do dia, saiu e foi para um lugar deserto. As multidões puseram-se a procurá-lo e, tendo-o encontrado, queriam retê-lo, impedindo-o que as deixasse. Ele, porém, lhes disse: Devo anunciar também a outras cidades a Boa Nova do Reino de Deus, pois é para isso que fui enviado. E pregava pelas sinagogas da Judéia.

4 As dimensões do Reino de Deus

No Evangelho de Mateus, em Mt 13, encontramos uma série de 7 comparações. Todas elas explicitam dimensões do Reino de Deus. O mistério do Reino dos céus é explicado para vários grupos de pessoas.

5 Oração presidida pelo Padre Joe Wright na abertura do senado de Kansas, USA

“Senhor, viemos diante de ti neste dia, para te pedir perdão e para pedir a tua direção. Sabemos que a tua Palavra disse: ‘Maldição àqueles que chamam ‘bem’ ao que está ‘mal’, e é exatamente o que temos feito.
Temos perdido o equilíbrio espiritual e temos mudado os nossos valores.
Temos explorado o pobre e temos chamado a isso de ‘sorte’.
Temos matado os nossos filhos que ainda não nasceram e temo-lo chamado ‘a livre escolha’.
Temos recompensado a preguiça e chamamo-la de ‘ajuda social’.
Temos abatido nossos condenados e chamamo-la de ‘justiça’.
Temos sido negligentes ao disciplinar os nossos filhos e chamamo-la ‘desenvolver sua auto-estima’.
Temos abusado do poder e temos chamado a isso: ‘Política’.
Temos cobiçado os bens do nosso vizinho e a isso temo-lo chamado ‘ter ambições’.
Temos contaminado as ondas de rádio e televisão com muita grosseria e pornografia e temo-lo chamado ‘liberdade de expressão’.
Temos ridicularizado os valores estabelecidos, desde há muito tempo, pelos nossos ancestrais e a isto temo-lo chamado de ‘obsoleto’ e ‘passado’.
Oh, Senhor, olha no profundo dos nossos corações. Purifica-nos e livra-nos dos nossos pecados. Amém”.
(Padre Joe Wright, da Central Catholic Church, recebeu em 6 semanas 5.000 chamadas telefônicas, das quais só 47 foram desfavoráveis).

Bibliografia
KRAMER, Pedro. Origem e Legislação do Deuteronômio. Programa de uma sociedade sem empobrecidos e excluídos, São Paulo: Paulinas, 2006
SOBRINO, Jon. Fora dos Pobres não há salvação. Pequenos ensaios utópico-proféticos, São Paulo: Paulinas, 2008
SOBRINO, Jon. Descer da cruz os pobres. Cristologia da Libertação, São Paulo: Paulinas, 2007
STORNIOLO, Ivo. Como ler O Evangelho de Mateus. O caminho da justiça, São Paulo: Paulinas, 1990
STORNIOLO, Ivo. Como ler O Evangelho de Lucas. Os pobres constroem a nova história, São Paulo: Paulinas, 1992

PROJETO DE UMA SOCIEDADE SEM EMPOBRECIDOS E EXCLUÍDOS
NA VIDA DOS PRIMEIROS CRISTÃOS NOS ATOS DOS APÓSTOLOS

Os primeiros cristãos nas comunidades em Jerusalém também procuraram viver a proposta de uma sociedade sem empobrecidos e excluídos. No livro dos Atos dos Apóstolos nós encontramos, sobretudo, três textos ou fotografias que apresentam os primeiros cristãos em Jerusalém testemunhando uma sociedade de partilha, de solidariedade e de fraternidade.

1 Estrutura dos sumários: At 2,42-47; 4,32-37; 5,12-16

Há consenso entre os pesquisadores de que os sumários se compõem de textos mais antigos e de adições posteriores. Alguns biblistas atribuem as partes mais antigas ao redator Lucas. Um deles é Jacques Dupont6. Outros peritos julgam que o redator Lucas tenha encontrado e usado uma fonte literária mais antiga, a qual ele desenvolveu, adicionando outros assuntos7. Eis o texto dos três sumários:

At 2,42 Eles eram perseverantes no ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna, na fração do pão e nas orações.
[43 Apossava-se de todos o temor, pois numerosos eram os prodígios e sinais que se realizavam por meio dos apóstolos].
44 Todos os que tinham abraçado a fé reuniam-se e punham tudo em comum: 45 vendiam suas propriedades e bens, e dividam-nos entre todos, segundo as necessidades de cada um.
[46 Dia após dia, unânimes, mostravam-se assíduos no Templo e partiam o pão pelas casas, tomando o alimento com alegria e simplicidade de coração. 47 Louvavam a Deus e gozavam da simpatia de todo o povo. E o Senhor acrescentava cada dia ao seu número os que seriam salvos].

At 4,32 A multidão dos que haviam crido eram um só coração e uma só alma. Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles era comum.
[33 Com grande poder os apóstolos davam o testemunho da ressurreição do Senhor, e todos tinham grande aceitação].
34 Não havia entre eles necessitado algum. De fato, os que possuíam terrenos ou casas, vendendo-os, traziam os valores das vendas e os depunham aos pés dos apóstolos. Distribuía-se então, a cada um, segundo sua necessidade.

[At 5,12 Pelas mãos dos apóstolos faziam-se numerosos sinais e prodígios no meio do povo... Costumavam estar, todos juntos, de comum acordo, no pórtico de Salomão, 13 e nenhum dos outros ousava juntar-se a eles, embora o povo os engrandecesse. 14 Mais e mais aderiam ao Senhor, pela fé, multidões de homens e de mulheres. 15 ... a ponto de levarem os doentes até para as ruas, colocando-os sobre leitos e em macas, para que, ao passar Pedro, ao menos sua sombra cobrisse algum deles. 16 Também das cidades vizinhas de Jerusalém acorria a multidão, trazendo enfermos e atormentados por espíritos impuros, os quais eram todos curados].

1.1 O que é um sumário?
Para Pablo Richard8, o sumário é um recurso literário típico de Lucas e é utilizado “para generalizar fatos concretos e para representar uma situação global e permanente [...] Um sumário é um resumo generalizador de fatos concretos, cf. 1,12-14; 5,42”. Para ele, o texto básico dos três sumários ou fotografias sobre a vida da comunidade cristã em Jerusalém é a frase em At 2,42-43. As demais frases dos sumários At 2,44-47; 4,32-35; 5,12-16 são desenvolvimentos e ampliações da frase básica, At 2,42-43. Ele ainda chama a atenção para a localização dos três sumários na estrutura dos cinco primeiros capítulos dos Atos: “O que nos é narrado nestes sumários são as atividades constitutivas da comunidade depois de Pentecostes; não se trata de fatos isolados, mas de ações permanentes e basilares”9.
Para os biblistas José Comblin e Ivo Storniolo apenas a frase At 2,42 provém de uma fonte literária ou de uma tradição mais antiga. Para Ivo Storniolo, At 2, 42 é o fundamento da vida da comunidade em Jerusalém: “Este versículo representa a fonte mais antiga, completada com outras notícias”10.
Para José Comblin, “o mais provável é que o v. 42 vem de uma tradição antiga. Lucas tomou-a como ponto de partida e desenvolveu esse versículo. De fato há muitas repetições nos três sumários”11.
Para Jacques Dupont12, At 2,42 não provém de uma fonte ou tradição mais antiga, mas é uma frase criada por Lucas. Esta, ele mesmo explica e pormenoriza em At 2,44-45 e em At 4,32.34-35. Para esse exegeta, três expressões, que caracterizam a fidelidade e a perseverança dos novos convertidos a Jesus Cristo, não parecem suscitar grandes dificuldades para a sua compreensão. Mas, a expressão, que os crentes eram perseverantes na koinonia, na comunhão fraterna, é ambígua e presta-se à discussão. Porque, para ele, At 4,32: A multidão dos crentes tinha um só coração e uma só alma. Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles era comum (koiná), refere-se a dois aspectos complementares ou a dois traços da vida comunitária dos primeiros cristãos: “a unidade espiritual existente entre os fiéis acarreta a prática da comunhão no plano dos bens espirituais”13.
Pablo Richard distingue o modo de viver em comunidade através de duas dimensões: uma subjetiva e a outra objetiva. Através da dimensão subjetiva os primeiros cristãos “constituíam um só corpo, com um só coração e uma só alma”14. A dimensão objetiva se caracteriza por três realidades básicas: 1) eles tinham tudo em comum, pois vendiam suas propriedades e bens (2,44-45); 2) tudo era repartido para cada um, conforme as suas necessidades (2,45; 4,35); 3) não havia nenhum necessitado entre eles (4,34).

1.2 A expressão: ‘Um só coração e uma só alma’

Jacques Dupont debruça-se sobre essas duas dimensões comunitárias dos primeiros cristãos em Jerusalém e procura entendê-las melhor. Ele primeiramente constata que a expressão ‘um só coração e uma só alma’ é tipicamente bíblica e pouco comum entre os gregos helenistas. No livro do Deuteronômio esta expressão é muito usada: Amarás a Iahweh, teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua força. Que estas palavras que hoje te ordeno estejam em teu coração (Dt 6,5-6; cf. 4,29; 10,12; 11,13; 13,4; 26,10; 30,2.6.10, etc).
Esse exegeta, além disso, observa que Paulo emprega nas suas cartas a expressão ‘uma só alma’. Ele exorta os cristãos filipenses para que vivam vida digna do evangelho, para que eu, indo ver-vos ou estando longe, ouça dizer de vós que estais firmes num só espírito, lutando juntos com uma só alma pela fé do evangelho (Fl 1,27). E pouco mais adiante ele acrescenta: levai à plenitude minha alegria, pondo-vos acordes no mesmo sentimento, no mesmo amor, numa só alma, num só pensamento (2,2; 4,2; 2Cor 13,11; Rm 12,16; 15,5). Ele resume suas observações, destacando: “Esta parênese cristã nos esclarece sobre o ensinamento de Lucas quando descreve os primeiros cristãos como tendo ‘um só coração e uma só alma’: trata-se de sua perfeita concórdia, da total união dos espíritos reinante entre eles”15.
Para José Comblin, os dois termos “coração e alma designam juntos a personalidade no seu centro: formavam uma só pessoa, agindo, pensando, respirando, orando como uma só pessoa”16. A respeito disso, Ivo Storniolo escreve: “A comunidade tem um só coração e uma só alma, expressão bíblica que significa a comum unanimidade, isto é, o mesmo ânimo em todos, ânimo de viver o projeto de Deus e empenhar tudo no serviço a esse projeto”17.
Neste contexto é ainda relevante observar que as três fotografias das comunidades cristãs em Jerusalém estão localizadas no livro dos Atos após a vinda e a recepção do Espírito Santo. Se, portanto, os cristãos se deixarem guiar e conduzir pelo Espírito de Deus e de Jesus, então, sim, a vida nova e relações de qualidade são possíveis entre os cristãos. Esta proposta de vida, além disso, vem reforçada pelo fato de que os primeiros cristãos eram perseverantes no ‘ensino dos apóstolos’. Este anúncio apostólico compreendia a ressurreição de Jesus e sua vida como testemunha do Reino de Deus. Esta fundamentação e motivação tornam facilmente compreensíveis que os primeiros cristãos, de fato, partilhavam tudo o que são e o que têm. A respeito dessa atitude, Jesus foi muito claro. Para uma pessoa, de certo destaque econômico e social, ele propõe: Uma coisa ainda te falta. Vende tudo o que tens, distribui aos pobres e terás um tesouro nos céus; depois vem e segue-me (Lc 18,22; 5,11.18; 14,33).

2 Perseverança dos cristãos na comunhão fraterna

Para Jacques Dupont, a comunhão de bens entre os primeiros cristãos em Jerusalém é conseqüência do fato de que eles gozam dos mesmos bens de Deus, de Jesus e do Espírito Santo: “São esses bens compartilhados por todos juntos, que asseguram o fundamento objetivo da comunhão fraterna. Uma comunhão tão profunda conduz naturalmente à obrigação de partilhar bens temporais com os que deles carecem”18. Ele exemplifica isso na atitude de Paulo que, com motivações diferentes, organiza coletas entre as suas comunidades para as comunidades pobres de Jerusalém: A Macedônia e a Acaia houveram por bem fazer uma coleta em prol dos santos de Jerusalém que estão na pobreza. Houveram, por bem, é verdade, mas eles lhes eram devedores: porque se as nações participaram dos seus bens espirituais devem, por sua vez, servi-los nas coisas temporais (Rm 15,27-28; cf. 2Cor 8-9).

2.1 Eles tinham tudo em comum

As afirmações, tanto em At 2,44: Eles tinham tudo em comum como em At 4,32: tudo entre eles era comum, destacam o adjetivo koiná, ‘comum’. Ele faz eco ao substantivo, koinonia, ‘comunhão’. Para Jacques Dupont19, na antiguidade não havia a propriedade privada. A felicidade desses tempos primitivos era o ideal de uma vida em sociedade segundo a natureza, onde tudo era comum a todos. Esse ideal de uma vida social encantou os filósofos gregos, como Pitágoras, Platão e Aristóteles. O provérbio que os motivou a pôr tudo em comum era: “Entre amigos tudo é comum”.
No país de Israel há também um grupo que procura viver a comunhão de bens. São os essênios. Suas motivações, porém, não provêm da filosofia grega. A respeito deles escreve Flávio Josefo: ”Desprezam a riqueza e seus usos comunitários causam admiração. Procurar-se-ia em vão entre eles alguém, cuja fortuna superasse a dos demais. Com efeito, é lei que os que aderem à seita renunciam a seus bens em favor desta, de modo que entre eles não existe a humilhação da indigência, nem o orgulho da riqueza, mas juntam-se as posses de todos, para formar uma só propriedade, como acontece entre irmãos [...] Os administradores da propriedade comum são escolhidos mediante imposição das mãos, enquanto que um como o outro deve estar disposto ao serviço de toda a comunidade” (Bell. II,8,3 na versão alemã).

2.2 Não havia entre eles qualquer indigente

A afirmação acima, de que as comunidades cristãs em Jerusalém tinham tudo em comum, era muito conhecida no mundo helenista, sobretudo pelos filósofos gregos. A característica dos primeiros cristãos em Jerusalém, em At 4,34: Não havia entre eles necessitado algum, parece ter ligação com Dt 15,4: É verdade que em teu meio não haverá nenhum pobre, porque Iahweh vai abençoar-te na terra que Iahweh teu Deus te dará, para que a possuas como herança. Para que uma comunidade alcance que nela não haja necessitados é obviamente necessário que todos partilhem o que têm em termos econômicos, em serviços sociais e em doação. Ivo Storniolo constata: “É o advento simbólico de uma nova humanidade, que usufrui igualitariamente da vida – dom que Deus deu a todos”20.

2.3 Vendiam suas propriedades

Das primeiras comunidades cristãs em Jerusalém diz-se ainda que os cristãos vendiam suas propriedades e bens e dividiam-nos entre todos, segundo as necessidades de cada um (At 2,45). Os que possuíam terrenos ou casas, vendendo-os, traziam os valores das vendas e os depunham aos pés dos apóstolos. Distribuía-se então, a cada um, segundo sua necessidade (At 4,34-35). Neste contexto destaca-se a generosidade de Barnabé (At 4,36-37) e a falta de generosidade do casal Ananias e Safira (At 5,1-11). Porque ninguém era obrigado a vender uma propriedade e depositar o montante recebido para criar o equilíbrio econômico na comunidade. O pecado do casal consistia em querer enganar os apóstolos. Ele queria dar a impressão de generosidade e de doação, entregando o valor total da venda, quando, de fato, desvia uma parte do valor da venda.
Outras informações do livro dos Atos mostram-nos que a partilha e a generosidade dos cristãos em Jerusalém eram necessárias. Em At 6,1-7 descreve-se o fato da assistência diária às viúvas em Jerusalém. Além disso, os apóstolos da Galiléia, vivendo e atuando em Jerusalém sem poder exercer uma profissão, também deviam ser sustentados pelos cristãos de Jerusalém. Disto tudo José Comblin conclui: “A visão lucana da comunidade de Jerusalém não é pura utopia, mas ela reflete uma certa realidade histórica. Por isso mesmo a descrição mistura traços utópicos com traços de realismo prático”21.

2.4 A novidade das comunidades cristãs

José Comblin observa que a comunhão fraterna entre os cristãos era nova, singular, inédita e inaudita. Porque a comunhão fraterna nas comunidades gregas era concretizada entre amigos e a koinonia nas comunidades monásticas dos essênios era praticada entre iguais. Mas, a koinonia nas comunidades cristãs é uma novidade porque era vivida entre cristãos ricos e pobres. Aqueles, movidos pela proposta do Reino de Deus por uma sociedade sem empobrecidos e excluídos e pelo testemunho de Jesus, vendiam o que têm com a finalidade de criar a comunhão fraterna entre membros ricos e pobres. Esta koinonia cristã de bens é material e concreta. Aqui não se trata de disposições interiores nem de sentimentos: “Esta representação supõe que há ricos que têm bens para vender e pobres que somente têm necessidades. Entre eles se restabelece a igualdade. Pois a comunhão é igualdade de condições”22. Esta é a proposta de solução de Lucas e de Paulo para que haja uma sociedade nova e alternativa, sem empobrecidos e excluídos.
3 Perseverança dos primeiros cristãos no ensinamento dos apóstolos, na fração do pão e nas orações

Como já foi dito acima, quatro são os elementos constitutivos da vida das primeiras comunidades em Jerusalém. O que quer dizer, ser perseverante na didaké, ‘ensinamento’ dos apóstolos? Para o redator Lucas isto significa optar por Jesus morto e ressuscitado e seguí-lo conforme seus ensinamentos e dos apóstolos, contidos no evangelho segundo Lucas. Ele é o fundamento e o corrimão das comunidades cristãs.
O que quer dizer, ser perseverante na fração do pão? A expressão klassei tou artou, ‘partir ou fracionar o pão’ refere-se à celebração eucarística (At 20,7; 1Cor 10,16). Segundo o costume judaico, no início da refeição o pai de família ou o líder do grupo tomava o pão, agradecia a Deus, partia o pão e dava um pedaço aos presentes. Assim fazia Jesus nas refeições com seus discípulos e também o repetiu na última ceia. Os cristãos celebravam a eucaristia nas suas casas: partiam o pão pelas casas, tomando o alimento com alegria e simplicidade de coração. Nas comunidades paulinas (1Cor 10,16; 11,25) a celebração eucarística era precedida por uma refeição comunitária. Esta era talvez a única refeição por dia para os pobres e era uma chance aos ricos para que partilhassem com os necessitados o alimento, criando assim a comunhão fraterna. A respeito disso, Ivo Storniolo escreve: “A Eucaristia se tornava, então, o anúncio profético de uma humanidade reconciliada, perenizando o dom do amor num gesto de partilha concreto: a refeição em comum”23.
O que quer dizer, ser perseverante nas orações? Os cristãos não só celebravam a eucaristia nas suas casas, mas também dia após dia, unânimes, encontravam-se assíduos no Templo (At 2,46). Especialmente as comunidades cristãs em Jerusalém seguiam os costumes dos judeus que se reuniam no templo para rezar. Lucas destaca a continuidade entre os cristãos e os judeus, rezando juntos no templo. A celebração eucarística como a novidade e a particularidade cristã, no entanto, acontecia nas casas.
Lucas igualmente ressalta a continuidade entre os cristãos e os judeus no fato de os apóstolos realizarem prodígios e sinais (At 2,43; 4,33; 5,12-16) assim como Jesus os realizava. Isto expressa que Deus está com eles, como estava com Jesus, e assim eles continuam a prática poderosa e libertadora de Jesus ressuscitado, na força do Espírito Santo, para que haja uma sociedade sem empobrecidos e excluídos.

Bibliografia
COMBLIN, José. Atos dos Apóstolos, Vol. I: 1-12, Petrópolis: Vozes, 1988
DUPONT, Jacques. Estudo sobre os Atos dos Apóstolos, São Paulo: Paulinas, 1974
RICHARD, Pablo. O movimento de Jesus depois da ressurreição. Uma interpretação libertadora dos Atos dos Apóstolos, São Paulo: Paulinas, 1999
STORNIOLO, Ivo. Como ler Os Atos dos Apóstolos. O caminho do evangelho, São Paulo: Paulus, 1993
Pedro Kramer, osfs
kramer_pedro@yahoo.com




LEIS SOCIAIS DO CÓDIGO DEUTERONÔMICO:
ESCRAVO, LEVITA, ESTRANGEIRO, ÓRFÃO E À VIÚVA

O Código Deuteronômico, presente nos capítulos Dt 5.12-28, é, de acordo com Lohfink, um conjunto de leis orgânico, lógico e completo. Ele se compõe dos dez mandamentos da Lei de Deus, em Dt 5,6-21, e das suas leis complementares, em Dt 12-28. Ele orienta a vida e a missão do povo de Israel na história. O decálogo contém princípios normativos e orientadores. Ele, portanto, necessita de leis complementares que concretizem, atualizem e detalhem os seus respectivos princípios para um período determinado da história que é o século VII a. C.
Lohfink afirma que, a legislação deuteronômica é o caminho para uma sociedade sem empobrecidos e excluídos, alternativa e solidária, projetando assim a possibilidade de um mundo novo e diferente.

Quatorze leis de assistência e promoção social do Código Deuteronômico

1 Repouso semanal: Dt 5,14

O sétimo dia, porém, é o sábado de Iahweh teu Deus. Não farás nenhum trabalho, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu escravo, nem tua escrava, nem teu boi, nem teu jumento, nem qualquer dos teus animais, nem o estrangeiro que está em tuas portas. Deste modo teu escravo e tua escrava poderão repousar com tu.
Após seis dias de trabalho, a família, os animais, o escravo e a escrava terão um dia de repouso. É importante ressaltar que até o estrangeiro é beneficiado, ele que emigrou de sua pátria e imigrou no país de Israel, passando a morar entre os israelitas e fazer parte daquela sociedade. Ele, como estrangeiro, no entanto, não tem todos os direitos e deveres como um israelita. Por isso, ele é economicamente fraco e legalmente dependente. Os escravos e as escravas, por sua vez, tinham normalmente garantidos os direitos à comida, à bebida e às vestes. Eles, portanto, não eram considerados pobres. O que lhes falta é a liberdade e a honra. Uma vez por semana e a cada semana, no sábado, os habitantes do país de Israel fazem uma experiência igualitária. Esta até beneficia os animais.

2 Beneficiados pelos sacrifícios: Dt 12,7

E comereis lá, diante de Iahweh vosso Deus, alegrando-vos com todo o empreendimento da tua mão, vós e vossas famílias, com o que Iahweh teu Deus te houver abençoado.
Devemos ter presente que o lugar da liturgia ao Deus Iavé é única e exclusivamente o templo de Jerusalém. A segunda lei de assistência e promoção social da legislação deuteronômica, visa beneficiar, proteger e defender o casal agricultor que tem patrimônio e vive em matrimônio com filhos e filhas. Os sacrifícios deviam ser consumidos no templo de Jerusalém pelo casal e seus filhos para aprofundar a sua fé no Deus Iavé e renovar o seguimento a ele como o Deus libertador e doador da terra prometida.

3 Beneficiados pelos sacrifícios: Dt 12,12

Alegrar-vos-eis diante de Iahweh vosso Deus, vós, vossos filhos e vossas filhas, vossos servos e vossas servas, e o levita que mora em vossas cidades, pois ele não tem parte nem herança convosco.
Esta lei diz respeito ao quando os sacrifícios deveriam ser oferecidos a Iavé. As expressões “lugar de repouso” e “herança” são referências à vida dos israelitas na terra de Canaã. Ocupando, uma vez, a terra prometida é possível que o casal agricultor tenha necessidade de ter escravos e escravas. Estes, no entanto, mesmo lhes faltando a liberdade e a honra, devem acompanhar o casal agricultor com seus filhos e suas filhas para o templo de Jerusalém. Aí eles comem, bebem e festejam como a família de agricultores.

4 Beneficiados pelo dízimo anual e primogênitos: Dt 12,18

Tu os comerás diante de Iahweh teu Deus, somente no lugar que Iahweh teu Deus houver escolhido, tu, teu filho, tua filha, teu servo e tua serva, e o levita que habita contigo. E te alegrarás diante de Iahweh teu Deus de todo o empreendimento da tua mão.
O legislador deuteronômico determina primeiramente que o dízimo do trigo, vinho e óleo, juntamente com os primogênitos bovinos e ovinos e, além disso, os sacrifícios votivos e espontâneos bem como os dons da tua mão devem ser unicamente consumidos no templo de Jerusalém. Desta fartura de alimentos são beneficiados o escravo, a escrava e o levita. É interessante que esta partilha deve ser feita na mais completa alegria.

5 Beneficiados pelo dízimo anual: Dt 14,26-27

Lá trocarás o dinheiro por tudo o que desejares: vacas, ovelhas, vinho, bebida embriagante (cerveja), tudo enfim que te apetecer. Comerás lá, diante de Iahweh teu Deus, e te alegrarás, tu e a tua família. Quanto ao levita que mora nas tuas cidades, não o abandonarás, pois ele não tem parte e nem herança contigo.
Nesta lei, o legislador deuteronômico determina que o dízimo da semeadura e os primogênitos bovinos e ovinos devem ser oferecidos e consumidos no templo de Jerusalém, “todos os anos”. Desta vez, não são mencionados os sacrifícios votivos e os espontâneos bem como os dons da tua mão. Estes sacrifícios não eram oferecidos todos os anos. Por isso, esta lei beneficia o casal agricultor, sua família e o levita. Os escravos e as escravas não participam desta vez.
6 Beneficiados pelo dízimo trienal: Dt 14,29

Virá então o levita, pois ele não tem parte nem herança contigo, o estrangeiro, o órfão e a viúva que vivem nas tuas cidades, e eles comerão e se saciarão. Deste modo Iahweh teu Deus te abençoará em todo o teu trabalho que tua mão realizar.
A cada três anos, o dizimo trienal deve ser diretamente entregue ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva. O casal agricultor tomará o dízimo trienal da colheita e o colocará no portão da cidade, que é o lugar mais público dela. Aí também acontecem os julgamentos. Neste lugar de controle fácil, os grupos mencionados recebem o seu dízimo.

7 Beneficiados pela oferenda dos primogênitos: Dt 15,20
Tu o comerás cada ano diante de Iahweh teu Deus, tu e a tua casa, no lugar que Iahweh houver escolhido.
Todo o primogênito macho bovino e ovino é consagrado a Iavé. Em vista disso, esta lei proíbe que o casal agricultor tire proveito econômico desses primogênitos, tanto no trabalho como na tosquia. Tudo o que é consagrado e oferecido a Iavé, ele não o retém para si mesmo, como no holocausto, mas o devolve e o destina para beneficiar o ser humano, especialmente os grupos sociais vulneráveis tanto econômica como legalmente.

8 Beneficiados pela festa de Pentecostes: Dt 16,11

E te alegrarás diante de Iahweh teu Deus, - tu, teu filho e tua filha, teu servo e tua serva, o levita que vive em tua cidade, e o estrangeiro, o órfão e a viúva que vivem no meio de ti, - no lugar que Iahweh teu Deus houver escolhido para aí fazer habitar o seu nome .
Esta festa é móvel, isto é, ela não é comemorada num dia fixo. Ela é celebrada no quinquagésimo (= pentecostes em grego) dia, após o início da colheita dos cereais numa região. Como estes amadurecem, na terra de Israel, em épocas diferentes, então há, por um bom tempo, casais de agricultores da Galiléia ou da Samaria, trazendo em rodízio, para o templo de Jerusalém a oferta espontânea de cereais, proporcional à abundância da colheita do respectivo ano. Ela é também chamada a festa das semanas, isto é, as sete semanas, após o início da colheita. Os participantes beneficiados por estas refeições comunitárias diante de Iavé, no templo de Jerusalém, irão consumir os vários tipos de cereais, num clima de muita festa e alegria. Eles pertencem a grupos bem variados da sociedade israelita: o casal agricultor, seus filhos, seus servos, o levita, o estrangeiro, o órfão e a viúva. Todos os habitantes de Israel, como a família de Iavé, festejam juntos.

9 Beneficiados pela festa das Tendas: Dt 16,14

Celebrarás a festa das Tendas durante sete dias, após ter colhido o produto da tua eira e do teu lagar. E ficarás alegre com a tua festa tu, teu filho e tua filha, teu servo e tua serva, o levita e o estrangeiro, o órfão e a viúva que vivem nas tuas cidades.
A festa religiosa das Tendas era celebrada durante sete dias no santuário central de Jerusalém em honra de Iavé. Ela era festejada no outono do hemisfério norte, nos meses de outubro ou novembro, no final da colheita mais importante do ano. Colhiam-se grãos e a uva. Os grãos e a uva, transformada em vinho, eram partilhados como comida e bebida durante sete dias, num clima de muita alegria. Se os primogênitos eram também oferecidos nesta ocasião, então havia também muito consumo de carne. Os beneficiados pela festa das Tendas são os mesmos pela festa de Pentecostes, isto é, todos os israelitas como a grande família de Iavé.

10 Beneficiados pelo feixe esquecido durante a colheita: Dt 24,19

O feixe que é esquecido na roça torna-se, para ele, um meio para assistir e promover o estrangeiro, o órfão e a viúva. Porque a terra e sua produção são, em primeiro lugar, propriedade social e não propriedade particular. O legislador deuteronômico pensa tudo a partir do povo de Israel.

11 Beneficiados pela respiga: Dt 24,20
Quando sacudires os frutos da tua oliveira, não repasses os ramos: o resto será do estrangeiro, do órfão e da viúva.
A primeira respiga refere-se à colheita dos frutos da oliveira. É óbvio que apenas as olivas maduras são recolhidas. As verdes, quando amadurecem, pertencem por lei ao estrangeiro, ao órfão e à viúva.

12 Beneficiados pela respiga: Dt 24,21
Quando vindimares a tua vinha, não voltes a rebuscá-la: o resto será do estrangeiro, do órfão e da viúva.
A segunda lei da respiga refere-se aos cachos de uva verdes. Quando estes amadurecem, pertencem ao estrangeiro, ao órfão e à viúva. Assim esses grupos sem-terra podem também participar da fertilidade e da fecundidade da terra doada por Deus, tendo parte ativa das bênçãos divinas. Através das leis do feixe esquecido e da respiga da oliva e da uva, evitam-se os pedintes de esmola nas ruas e nos lugares públicos.

13 Beneficiados pelas primícias: Dt 26,11

Alegrar-te-ás, então, por todas as coisas boas que Iahweh teu Deus deu a ti e à tua casa e, juntamente contigo, o levita e o estrangeiro que reside em teu meio.
As primícias dos cachos de uva, das espigas de grãos e de todos os frutos do solo israelita, são recolhidas num cesto, levados para o templo de Jerusalém pelo casal agricultor. Lá ele irá primeiramente professar a sua fé em Iavé, o Deus libertador e doador da terra prometida. Depois disto, o casal agricultor, em profunda gratidão e alegria, consumirá com sua família, com o levita e o estrangeiro todas as coisas boas que ele lhes proporciona.

14 Beneficiados pelo dízimo trienal: Dt 26,12-13

No terceiro ano, o ano dos dízimos,quando tiveres acabado de separar todo o dízimo da tua colheita e o tiveres dado ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva para que comam e fiquem saciados em tuas cidades, tu dirás diante de Iahweh teu Deus: “Tirei de minha casa o que estava consagrado e o dei ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva, conforme todos os mandamentos que me ordenaste, Não transgredi e nem me esqueci dos teus mandamentos.
O dízimo a cada três anos, é depositado nos portões da cidade para o levita, o estrangeiro, o órfão e a viúva (Dt 14,28-29). Esta lei de assistência e promoção social beneficia o levita, o estrangeiro, o órfão e a viúva. Por ocasião da oferenda das primícias no templo de Jerusalém, o casal agricultor deve declarar diante de Iavé que observou fielmente a lei do dízimo trienal e as demais treze leis de assistência e promoção social. Através da observância destas leis de assistência e de promoção social, o povo de Israel se torna uma sociedade sem empobrecidos e excluídos porque ela é uma sociedade solidária e de fraternidade.

Pedro Kramer, osfs
1 SOBRINO, Jon. Fora dos pobres não há salvação, São Paulo: Paulinas, 2008, p. 125
2 Op. cit. p. 129
3 KRAMER, Pedro. Origem e Legislação do Deuteronômio. Programa de uma sociedade sem empobrecidos e excluídos, São Paulo: Paulinas, 2006, p.128
4 SOBRINO, Jon. Op. cit., pp. 136-137
5 Op. cit. pp. 139-140
6 DUPONT, Jacques. Estudo sobre os Atos dos Apóstolos, São Paulo: Paulinas, 1974, pp. 505-506
7 COMBLIN, José. Atos dos Apóstolos, Vol. I: 1-12, Petrópolis: Vozes, 1988, p. 106. RICHARAD, Pablo. O movimento de Jesus depois da ressurreição. Uma interpretação libertadora dos Atos dos Apóstolos, São Paulo: Paulinas, 1999, pp. 45-50. STORNIOLO, Ivo. Como ler Os Atos dos Apóstolos. O caminho do Evangelho, São Paulo: Paulus, 1993, pp. 41-46
8 Op. cit. p. 45
9 Op. cit. p. 46
10 Op. cit. p. 41
11 Op. cit. p. 106
12 Op. cit. pp. 505-506
13 Op. cit. p. 514
14 Op. cit. p. 47
15 Op. cit. p. 516
16 Op. cit. p. 129
17 Op. cit. p. 59
18 Op. cit. p. 517
19 Op. cit. pp. 506-510
20 Op. cit. p. 59
21 Op. cit. pp. 127-128
22 Op. cit. p. 105
23 Op. cit. p. 45